Tudo posso naquilo que me fortalece
Tudo posso naquilo que me fortalece.
Tudo posso naquilo que me fortalece.
Essa ideia, comumente associada à religiosidade, apresenta neste recorte da pesquisa de Bruno Miguel um vasto mundo de interpretações, desde a irônica até a sagrada.
“Tudo posso naquilo que me fortalece” entende que a força está no outro, na relação estabelecida, impossível de ser consumada individualmente. O poder se estabelece na relação, não em um dos elementos específicos apresentados, a construção do “entre” é o que interessa. Entre artista e obra, entre mensagem e leitura, entre o ontem e o amanhã, mas claramente não de maneira linear. Essas relações são abertas, rizomáticas, impossíveis de serem lidas com início, meio e fim. Tudo se contamina e prolifera com a velocidade da banda larga ou das relações virtuais. A obsolescência é programada para daqui a pouco.
Nesse universo de busca incessante pelo entretenimento superficial , como se encaixa a pintura, com seu tempo de fatura e consciência histórica? Com fé! Na sua capacidade de transformar a avalanche de imagens descartáveis cotidiana em algo maior, sagrado. Tanto quanto o pequeno mundo que a cerca (a arte) for capaz de convencer o resto do mundo. Como a construção de uma religião. Em um tempo de tantas religiões, entendendo que a maior delas é o capitalismo e que a economia engole estados, políticas e sistemas, o artista pode sempre boiar ou nadar (muitos se afogam), contra ou a favor. Destruindo ou consolidando. Mas até que ponto essas iniciativas transbordam o meio das artes e chegam ao mundo? Acredito que esses trabalhos de Bruno transpirem um conformismo irônico. Eles buscam o alcance que um videoclipe ou um comercial de televisão tem, mas com um comentário sofisticado sobre o mundo, travestido de sedução barata. Bruno lança mão de todo um arsenal pop para se comunicar. Estampas de camisetas dos anos 80, pichações, ícones populares, cartões de dias dos namorados, propagandas vintage norte-americanas e imagens de produtos da antiga Alemanha Oriental se misturam a azulejos e pratos, frutos da nossa herança colonial. Tudo ocasionalmente despretensioso e aparentemente belo! E não é dessa forma que se constrói uma imagem atualmente? Não é essa a lógica da sedução cool do mercado?
Bruno talvez não perceba, mas acima de qualquer retórica que ele desenvolva para justificar suas opções, a verdadeira força de sua pesquisa está no trabalho. Não na obra em si, mas na labuta do atelier, onde sua curiosidade e inquietação fazem com que sua pintura se mantenha em transformação. Onde suas compulsões buscam erros ansiosos por soluções imprevisíveis, tão generosas que se escondem por trás do deslumbre banal das imagens fáceis. Sua pesquisa é um tipo de pós-pop periférico, sempre relacionando alta e baixa cultura. Uma maquiagem vulgar e exuberante que superficialmente disfarça sua condição de eterna busca pela beleza. Não da pintura, mas do pintar.
Benjamin Moreh – Curador independente